Todos os anos
costumamos vir à praia no verão. Ficamos três ou quatro semanas. Neste verão
meus pais foram para o Tahiti e eu chamei os colegas de turma pra não ficar
sozinho. Somos cinco: três garotas, eu e o Leonel – meu melhor amigo.
As primeiras três semanas
foram ótimas: muito sol, mar, música, windsurf e comida boa.
As meninas cuidam
da bóia. Patrícia e Pietra – irmãs – são invencíveis no quesito sanduíches
originais: equilibram carboidratos e proteínas, sempre com um toque inusitado
ou um pão especial. Ana Bruna é especialista em massas e molhos de encher os
olhos. Eu e Leonel somos a dupla do churrasco.
E foi no maldito dia
do churrasco que tudo aconteceu.
Depois de comermos
horrores – pelo menos eu – Ana Bruna saiu pra nadar e não voltou. No começo
pensamos que tinha encontrado alguém e ficado conversando. Temos uns amigos na
praia, gente boa, que às vezes ficam conosco. Fomos às casas vizinhas e ninguém
havia visto Ana Bruna.
Saímos para
procurar nas redondezas, cada um num canto, e nada.
Nenhum de nós
pensava que ela tivesse se afogado. Ana Bruna é campeã de natação e tem um
ótimo preparo físico – e a gente não entende como, já que a sua alimentação é
baseada naquelas massas calóricas e deliciosas que engordam qualquer um.
Fomos ao Pronto-Socorro e aos dois
hospitais daqui e ninguém como ela havia dado entrada. Procuramos até os
salva-vidas da praia – mesmo sabendo que era exímia nadadora. Não houve nenhum incidente no mar nos últimos três dias.
Depois de uma
discussão sobre otimismo e pessimismo, decidimos ir ao necrotério. Eu sei, é
o ultimo lugar pra se procurar alguém, mas tínhamos que descartar essa possibilidade. Mas
graças a Deus não havia nenhum cadáver
feminino por lá.
Não sabíamos mais o
que pensar. Fomos à polícia e contamos tudo. O policial disse que era preciso
esperar mais um dia pra dar queixa do desaparecimento dela – lei mais besta.
Ninguém dormiu à
noite e eu era quem estava pior. Acho que estou gostando dela... Não quero nem imaginar
ter que lembrar depois de velho que o primeiro amor da minha vida desapareceu e
eu nem tive oportunidade de me declarar. Isso destrói a vida amorosa de
qualquer um...
Ela era linda de um
jeito especial. Não era uma beleza artificial. Ela não usava maquiagem, essas
coisas. Era linda porque era ela mesma. Cheia de vida, alegre, verdadeira...
Como fui idiota...
Meu Deus, estou falando no passado... Que absurdo... não, ela está bem. Ela é linda. Nós
vamos encontrá-la...
Começo a pensar
coisas horríveis que a minha mente se nega a acreditar: sequestro, morte...
Estou me sentindo enjoado... Não vão me dizer “eu sei o que vocês fizeram no
verão passado”, que aí é demais...
Preciso dormir,
meus olhos estão fechando, mas eu não consigo deixar de pensar na Ana Bruna...
Só quero que ela esteja bem...
Acordo suado e o
Leonel e a Patrícia estão ao meu redor. Disseram que falaram com a minha mãe no
MSN. Não estou entendendo nada, continuo enjoado... A ideia de perder Ana Bruna
está me deixando louco... Parece que eles estão falando em câmera lenta... Acho
que vou dormir de novo...
Escuto uma voz
chamando meu nome:
– Helson, acorda!
Você precisa tomar o remédio...
Abro os olhos e
vejo Pietra:
– Ainda bem, você
parece melhor. A tua febre era de 40 graus!
– Febre?
– Durante dois dias
você delirou...
– E a Ana Bruna? Eu
não posso perdê-la...
– Estou aqui! – ela
disse, se aproximando.
Que vergonha! Tanto
tempo sem me declarar e agora ela escuta isso desse jeito... Que bom que ela
está bem... Preciso falar com ela...
– Ana, onde você
estava? Fiquei muito preocupado!
–
Eu não saí daqui. Mas tua mãe me fez jurar... Nunca mais vamos deixar você
comer tanto. Uma indigestão dessas pode matar!
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Caro visitante, seu comentário será enviado para moderação.